Um manuseado trocadilho italiano diz: “Traduttore, tradittore”. Tradutor: traidor. Vi recentemente uma versão em espanhol dizendo que este estóico profissional “no es um traidor, sino um traedor”. Um trazedor: alguém que traz para nosso alcance algo que estava lá do outro lado do mundo. Gostei mais desta. Ambos os epítetos, aliás, dão certinho com o que tradutores chineses andam fazendo com livros de ficção científica ocidentais.
Dizem que a China tem um público de um bilhão de leitores. Lá, a FC tem historicamente um perfil didático, educativo, voltado para a divulgação da ciência entre os jovens. Ambiente mais que propício, por exemplo, para se traduzir Jules Verne. A tradução, contudo, enfrenta problemas, principalmente de ordem cultural – o leitor sabe pouco a respeito do Ocidente. Uma matéria de Ken Liu no saite io9 (aqui: http://tinyurl.com/ljshjas) mostra a verdadeira paráfrase realizada no primeiro parágrafo de Da Terra à Lua de Jules Verne (1865).
O texto original diz: “Durante a Guerra da Secessão dos Estados Unidos, um novo clube, muito influente, foi criado na cidade de Baltimore, em plena Maryland”. Uma tradução chinesa, feita via japonês, diz: “Quem já estudou a geografia e a história do mundo conhece um lugar chamado América. Quanto à Guerra da Independência americana, qualquer criança sabe que foi um acontecimento que fez o mundo estremecer, um feito que deve ser frequentemente relembrado e nunca esquecido. Bem: entre todos aqueles Estados que participaram da guerra, um deles se chamava Maryland, cuja capital, Baltimore, era uma famosa cidade fervilhante de multidões e com um intenso tráfego de cavalos e carruagens. Nessa cidade havia um clube, de magnífica aparência, e quando alguém via a bandeira americana hasteada e tremulando ao vento, experimentava um sentimento de admiração e reverência”.