Carlos Drummond de Andrade publicou em 1967, pela Editora do Autor (Rio), o curioso livro Uma Pedra no Meio do Caminho – Biografia de um Poema. Durante anos o poeta arquivou tudo que saía sobre seu poeminha da pedra, fosse a que pretexto fosse, e foi separando tudo em pastas. Os títulos de alguns capítulos dão uma idéia da variedade do material: “Reação pelo ridículo”, “Muita gente irritada”, “Popularidade, mesmo negativa”, “Os amigos da pedra”, “E os inimigos”, etc. Pena que seja meio difícil de obter, e não sei se foi reeditado.
Poucos poemas daquele século provocaram reações tão esperneantes. A pedra de Drummond tirou do sério muitos críticos. Deixaram-se perturbar demais pelo que o próprio autor considerava um poema interessante mas menor, quase uma brincadeira, por que estaria produzindo tanta raiva?
O momento auto-ajuda é você perceber que nem sempre a sua obra que vai ter impacto é sua epopéia de dois mil versos ou sua trilogia que engloba seis gêneros. Às vezes basta um pequeno escândalo estético desse tipo para fazer uma fama. Drummond impressiona pelo modo aparentemente tranquilo e equilibrado como descreve, transcreve e comenta o que disseram a seu respeito. Ele tem o ar kafkeano de um entomólogo examinando a si mesmo. Nesse livro ele republica também o poema em prosa “O Enigma” (Correio da Manhã, 1947; depois em “Novos poemas”, 1946-7), uma clara resposta ao poema da pedra, invertendo apenas seu ponto de vista narrativo.
O bombardeio massacrante dos articulistas que não gostaram da “pedra” é atenuado em parte pelos que a traduziram, a adaptaram, ou lhe deram variadas utilidades a título de homenagem. O poema mais famoso de Drummond virou um meme do seu tempo. Um meme cuja viralidade durou várias décadas e ainda não se esgotou de todo, porque hoje ou amanhã um cartunista do Norte ou um diretor de teatro do Sul vai lançar mão dele para produzir um efeito qualquer.