George Orwell previu a TV onipresente e vigilante; Aldous Huxley previu as drogas recreativas. Disse ele que mais importante do que praticar violências contra a população é dar-lhe pão e circo. Hoje, as ditaduras eletrônicas cobram caro pelo pão e pelo circo, e todo mundo paga feliz. A publicidade vive a bradar: “Não se reprima! O mundo lhe deve todos os seus sonhos! Você está aqui para satisfazer seus desejos, e seus desejos são estes produtos que oferecemos aqui! Quem tentar impedir você de se divertir é um fascista.” Esta é a linguagem da publicidade, idioma preferencial do capitalismo de consumo. O desejo é o desejo de possuir alguma coisa que está à venda. A felicidade está mais no ato de comprar do que no de consumir, porque é o primeiro que é estimulado, e assim que ele se cumpre percebemos (meio inconscientemente) que o segundo não nos era tão indispensável assim. Na verdade eu não queria ler esse livro, queria comprá-lo.
O discurso publicitário pós-anos 1960, pós-contracultura, apoderou-se de todas essas senhas dirigidas à juventude: desejo, vontade, aventura, afirmação de independência, de liberdade, individualidade. “Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada”. Como previu Huxley, as ditaduras do Super Ego repressor foram substituídas no Ocidente pelas ditaduras do Ego gratificado. O chiclete é mais eficaz do que o chicote. Em vez de reprimir, melhor manipular e direcionar os impulsos da multidão. Dar aos prisioneiros conflitos localizados e estanques, onde possam descarregar suas energias: o esporte, as eleições. A alternância de vitórias e derrotas que não mudam nada serve para dar a sensação de que “agora vai ser diferente”.
O próximo estágio é a participação eletrônica, interativa (vide as votações do “Big Brother”), que produz uma sensação de consulta democrática, “aqui quem decide é o povo”. Além de ser uma boa fonte de renda repartida entre a TV e as telefônicas, esse sistema serve de termômetro de opinião que ajuda o sistema a fazer correções de rumo, e um treinamento para que no futuro questões políticas como plebiscitos de mudança na Constituição venham a ser realizadas dessa forma (aposto como o Legislativo ainda vai permitir isso um dia).