O poeta Baudelaire, perguntado sobre “a vanguarda”, dizia que não gostava de metáforas militares. Vanguarda não é uma posição absoluta, apenas uma indicação relativa. O ex-presidente José Sarney já foi referido, em seu tempo, como “a vanguarda do atraso”, no sentido de ser o menos reacionário do grupo de políticos ligados à ditadura. O que me traz à memória os antigos desfiles estudantis de 7 de setembro, quando formávamos pelotões por ordem de altura. Era uma honra desfilar na primeira fileira de cada pelotão, chamada de “testa”. Acontece que desfilar nos pelotões mais à frente era também uma honra, de modo que quando a gente ficava na última fileira de um pelotão ficava soltando piada com o pessoal do pelotão que vinha logo atrás, chamando-os de “ralé”, ao que eles retrucavam: “Vocês são rabeira, nós somos testa”. E la nave va.
Todo artista de vanguarda imagina que é testa do primeiro pelotão, e que todos os artistas do mundo estão vindo atrás dele (ou se não estão, cabe a ele ironizá-los até que venham). Pintores abstratos proclamaram cem anos atrás a morte da pintura figurativa, tal como os poetas concretos proclamaram cinquenta anos atrás a morte da poesia discursiva. Talvez não tivessem razão em termos objetivos (as mortes anunciadas não aconteceram), mas compreende-se seu entusiasmo: sem uma crença cega na importância e na renovação estética do que está propondo ninguém consegue enfrentar o dilúvio de preconceitos que se derrama sobre essas tentativas de revolução.