Na sala de visitas do dr. Amarante só faltava a lareira, mas havia uisque e charutos. “Aqui em São Luís da Serra uma lareira não destoaria,” disse o visitante, o advogado Hugo Restelo. “Meus pais se mudaram para esta casa já na época dos aquecedores elétricos,” disse o dr. Amarante, puxando as cortinas que mostravam por imensas vidraças o vale começando a anoitecer. “Mas tínhamos lareira na casa anterior, onde nasci, e que já não existe mais.” “Não sabia,” disse Hugo, pegando o charuto do sogro para acender o seu. “Quando o sr. falava em sua casa aqui na montanha, sempre achei que fosse esta.” “A maioria das histórias de fato se refere a esta,” disse o doutor, que, na pia da parede oposta, fazia a torneira jorrar sobre uma caçamba de cubos de gelo, produzindo estalidos. “Vim morar aqui com dez ou onze anos. O mais importante aconteceu aqui.”
Brindaram erguendo os copos. Falaram sobre o passar do tempo. “Disse que a outra casa não existe mais?”, perguntou Hugo, olhando as luzinhas se acenderem nos chalés, em pontos distantes do vale. “Foi destruída acidentalmente. Eu estudava na Europa, tinha ido logo depois da morte dos meus pais,” disse o doutor. “A família do meu pai cuidou de tudo. Não lembro bem como foi” Uma pausa longa. Hugo; “Uma lareira é um lugar bom para contar histórias, ouvir...” “Passávamos noites agradáveis junto ao fogo,” disse o doutor. “Era lareira a lenha?” perguntou Hugo. “Não, era a gás, meu pai tinha inventado um sistema de canalização Ele trazia uma parte do gás que alimentava o moinho até nossa casa. Era gás.”