Em 2013, J. K. Rowling, autora de “Harry Potter”, publicou o romance policial The Cuckoo’s Calling, sob o pseudônimo de Robert Galbraith. O livro recebeu alguns elogios mas não esgotou a tiragem inicial de 1.500 cópias. Houve um vazamento, por indiscrição de uma das poucas pessoas que sabiam do segredo, e a imprensa investigou até comprovar que o livro era de Rowling. Na mesma hora, 140 mil exemplares foram impressos e vendidos num piscar de olhos.
É um assunto recorrente na imprensa cultural: o que aconteceria se um livro original de um autor famoso fosse submetido anonimamente a uma editora? Foi o que aconteceu com Claire Chazal, apresentadora de TV francesa cujo romance L’institutrice fez grande sucesso em 1997. Em 2000 o jornal Voici enviou o texto do romance, atribuído a uma autora imaginária, a várias editoras, inclusive a Plon, que publicara o livro original. O título foi mudado para La maîtresse d’école, a ação foi transferida de Auvergne para a Lorena, e a personagem principal, que se chamava Jeanne Villard, teve o nome trocado para Charlotte Florange. Além disso, o parágrafo de abertura foi mudado – trouxeram para o início um trecho que no original aparecia mais adiante. Foi o que bastou para que o livro fosse recusado, inclusive pela Plon, que publicou o romance original.
A revista explicou: “Queríamos demonstrar que os romances de autores estreantes que já são personalidades públicas recebem um tratamento especial que não é dedicado a um livro de estreante anônimo.” O que me parece óbvio, aliás. É o que eu faria se fosse editor. Por que não investir mais num nome que já tem grande popularidade? O erro, no caso, é não haver na editora quem reconhecesse um livro publicado por ela mesma (e, nas outras editoras, ninguém capaz de reconhecer um romance de sucesso). Isso mostra apenas o quanto o trabalho editorial em grande escala é segmentado, fracionado, sem que A saiba o que está sendo feito por B. Ninguém pode ler tudo. Ninguém tenta ler tudo.