(O Bode Gaiato)
Basta ser nordestino para ser, de alguma maneira, superior a quem o não é. Estou sendo preconceituoso ou arrogante ao dizer isto? Espero que não, porque o digo com a consciência tranquila de que o que os nordestinos são, filosoficamente falando, é algo
que independe tanto da minha opinião quanto da do meu interlocutor. Mas eu tenho, sim, o direito de falar que os nordestinos são superiores a todos os demais, assim como o torcedor do Bambala ou do Arimatéia pode dizer o mesmo de seu time, e qualquer filho de Deus pode dizer o mesmo sobre o Deus de quem é filho.
Gozações regionalistas muitas vezes se dão em paz quando feitas entre iguais, de parte a parte, cada qual ironizando as pretensões do outro e afirmando a grandiosidade de sua própria pátria. Vira uma forma brincalhona de convívio, uma troca amigável de alfinetadas. O perigo existe quando se dá numa relação vertical de poder, quando o que está por cima não apenas explora o trabalho do outro, mas, para manter esse estado de coisas, esmaga o seu amor próprio, faz com que ele primeiro despreze e depois odeie suas origens. Já vi muitos casos de nordestinos exilados que assimilaram sotaque, hábitos, cultura, valores, e apagaram da memória tudo que houvera antes. Alguns por um verdadeiro trauma, por tática de sobrevivência.
Você manda um projeto para um órgão público ou para um edital de empresa no Sudeste, o projeto não passa, aí você diz: “Claro, eles não vão deixar um nordestino passar na frente dos outros.” Como existe o precedente de mil pequenas situações de preconceito, o sujeito insatisfeito expande isso para qualquer situação. Recusa-se a admitir que podem ter aparecido projetos melhores que o dele, por motivos totalmente diversos. Recusa-se a admitir que o projeto dele pode não ser tão interessante assim para a empresa ou o órgão a que foi submetido, independente da origem geográfica.