A chácara foi comprada por um estrangeiro misterioso, homem cheio de sotaque, que come de maneira espalhafatosa e pouco educada. O rapaz meio que antipatiza com ele, mas acaba se tornando seu empregado, fazendo pequenos mandados, e o conto é o estreitamento gradual dessa relação.
O segundo enredo é o que acontece no vilarejo, onde de vez em quando chegam homens de fora interessados nos detalhes da vida do gringo, que se chama “Giovânio”, tem sotaque italianado (“bisonha outra garrafa”, “lei quer ver?”, “não laxa as armas!”), tem um cachorro chamado “Mussulino”... O narrador registra que o gringo comprou a chácara “no ano da espanhola”, ou seja, 1918 aproximadamente.
Os homens de fora têm perguntas específicas para fazer ao rapaz, sobre seu empregador: “se ele não tinha numa perna, em baixo, sinal velho de coleira, argolão de ferro, de criminoso fugido da prisão”. Não; nada.
Todo gringo é excêntrico; pode-se argumentar que um migrante é alguém que se afastou do próprio centro, e sempre vai ser visto meio de viés pelos naturais do centro-alheio onde se instala.
Guimarães Rosa vai desenhando esse personagem através dos olhos do rapaz, o narrador, cheio das pequenas picuinhas dos interioranos contra quem vem de fora, “vindo comprar terra cristã” e que decerto “tinha remorso, de ser estrangeiro e rico.”
Um dia, ele se vê novamente convocado ao vilarejo para dar parte aos forasteiros, desconfortavelmente, dos hábitos de seu empregador, mediante pequenas gratificações, que embolsa, carrancudo. Ele diz que Seu Giovânio lhe pede que compre cerveja, explicando que é para o cavalo, e quando as autoridades o visitam na chácara, e o submetem a teste, pois não é que o cavalo bebe cerveja mesmo?!
Mesmo assim, a aura de mistério permanece. Reivalino percebe desde cedo que a casa, que é grande, vive trancada, e Seu Giovânio dorme, cozinha e come nos espaços do lado de fora. Quando as autoridades dão uma incerta, ele abre a casa e os conduz a um aposento onde todos se deparam, espantados, com “um cavalão branco, empalhado”, em tamanho natural, trabalho perfeito, e que deve ter exigido um grande esforço no traslado e remontagem.
Na reta final do conto, Seu Giovânio abre o jogo, chama as autoridades e revela o segredo: seu irmão, “Josepe”, que vivia trancado na casa, acaba de morrer. E quanto a autoridade local exige exame do cadáver...
Mas aí se viu só o horror, de nós todos, com caridade de olhos: o morto não tinha cara, a bem dizer – só um buracão enorme, cicatrizado antigo, medonho, sem nariz, sem faces – a gente devassava alvos ossos, o começo da goela, gorgomilhos, golas – “Que esta é a guerra,” seu Giovânio explicou...
Não avistei mais o meu Patrão. Soube que ele morreu, quando em testamento deixou a chácara para mim. Mandei erguer sepulturas, dizer as missas, por ele, pelo irmão, por minha mãe. Mandei vender o lugar, mas, primeiro, cortarem abaixo as árvores, e enterrar no campo o trem, que se achava, naquele referido quarto.